A Educação de Jovens e Adultos no Brasil e a Influência de Paulo Freire

Bem vindo ao Blog de discussão sobre Paulo Freire e a EJA no Brasil.

Esse blog foi criado no contexto das aulas de Temas Fundamentais das Ciências da Educação do curso de Pedagogia Noturno na UFMG no primeiro semestre de 2010, com o objetivo de compreendermos a influência desse educador nas práticas educacionais de EJA no Brasil e no uso de tecnologias como recurso didático na EJA, particularmente na região metropolitana de Belo Horizonte.

sábado, 17 de julho de 2010

A escrita: Tecnologia (re)inventada na EJA

A LEITURA LITERÁRIA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Resumo: Neste artigo são analizadas a relação entre ensino/aprendizagem da leitura e a formação de leitores autônomos na Educação de Jovens e Adultos. Para isso foi abordada a necessidade do ensino/aprendizado de vários gêneros textuais e a compreensão das especificidades de cada um. Dentro das variedades de gêneros textuais foi abordada a leitura literária como formadora de leitores.
Palavras chaves: Leitura, Gêneros Textuais, Leitura Literária, Leitores Autônomos
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Introdução
Desenvolver a leitura autônoma é uma das propostas da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Para que essa autonomia se efetive forna-se necessário que os estudantes, mesmo os da alfabetização, tenha contato - através do professor - com os vários gêneros textuais que circulam em nossa sociedade desde os primeiros dias de aula.
Esse contato se faz necessário devido à especificidade de cada gênero e as estratégias específicas para a leitura de cada um, levando assim os leitores a se envolverem e compreenderem, de forma diferenciada, cada texto a partir: dos seus objetivos, dos suportes, da linguagem e do objeto.
O estudo das especificidades de cada gênero, dentro ou fora de sala de aula, leva ao desenvolvimento de capacidades que auxiliem na formação de um futuro leitor autônomo que seja capaz de se envolver e compreender as especificidades de cada gênero circulante em nossa sociedade (Batista, 2005).
Dentro da diversidade textual que circula em nossa sociedade destacarei a leitura literária e o seu papel na formação de novos leitores, especificamente leitores jovens e adultos. Se queremos formar leitores autônomos neste segmento de ensino devemos, como argumenta Jane Paiva (2005), juntamente com as leituras informativas ou de uso cotidiano oferecer a esses leitores a oportunidade de envolver-se com gêneros literários de forma integral e não como desculpas para o estudo da gramática, sintaxe, ortografia e estudos da língua.
A formação de Leitores Jovens e Adultos
"Ler, verbo transitivo, é um processo complexo e multifacetado: dependente da natureza, do tipo, do gênero daquilo que se lê, e depende do objetivo que se tem ao ler. Não se lê um editorial de jornal da mesma maneira e com os mesmos objetivos com que se lê a crônica de Veríssimo no mesmo jornal; não se lê um poema de Drummond da mesma maneira e com os mesmos objetivos com que se lê a entrevista do político; não se lê um manual de instalações de um aparelho de som da mesma forma e com os mesmos objetivos com que se lê o último livro de Saramago. Só para dar alguns exemplos". (Magda Soares in Paulino, 2005).
Como as crianças, os jovens e adultos ao aprenderem a ler um texto precisam compreender as diferenças de objetivos, linguagens, estruturas e suportes em que os mesmos circulam para poderem elaborar estratégias que auxiliem na compreensão dos vários gêneros textuais (Batista, 2005). Até as estratégias para a leitura devem ser trabalhadas juntamente com os estudantes, pelo professor, para favorecer a leitura fluente e a compreensão do texto trabalhado em sala, pois nada é natural no processo de aprendizagem da leitura (Cafieiro, 2005).
Para que esse trabalho seja desenvolvido o professor deve estar atento a algumas capacidades e habilidades a serem trabalhadas e planejadas de forma a favorecer a formação de leitores autônomos em quaisquer situações que lhe sejam exigidas o envolvimento com a leitura (Batista, 2005). Não é porque são jovens e adultos, inseridos num mundo letrado que lhe exigiu estratégias de sobrevivência diante da leitura, que devemos lhes oferecer as possibilidades de textos apenas como apreensão mecânica da leitura e da escrita para cumprir uma etapa da alfabetização (Teixeira, 2004), nem nos equivocarmos ao pensar que por já estarem envolvidos neste mundo letrado algumas habilidades e capacidades já foram desenvolvidas ou são naturais.
Atitudes como gostar de ler, interessar-se pela leitura e pelo livro, saber a função social de alguns gêneros são contruídas (Batista, 2005). Faz-se necessário construir com eles uma leitura crítica dos textos orais e escritos apreendendo seus significados (Teixeira, 2004). Para isso é preciso estar claro para o professor quais capacidades e habilidades os estudantes já possuem e quais precisam ser desenvolvidas para se construir o senso crítico e autonomia do leitor nas várias leituras que realiza (Batista, 2005). Segundo Batista (2005) e Cafieiro (2005) seria necessário desenvolver as seguintes capacidades e habilidades no processo de ensino/aprendizagem da leitura: atitude e disposição favorável à leitura; capacidade de decifração; fluência na leitura; compreensão de um texto: identificando a finalidade e funções da leitura a partir do gênero e do suporte; antecipação de conteúdo a partir de seu suporte, gênero e contextualização; levantamento e confirmação de hipóteses; realizar inferências durante a leitura, e construir a compreensão global do texto (conseguindo resumir, oralmente ou por escrito, a idéia central do texto). Essas capacidades e habilidades devem ser construídas, dentro de sala de aula, durante o processo de ensino/aprendizagem, desconstruíndo a concepção de que as mesmas são naturais aos estudantes (Batista, 2005) ou que devam ser trabalhadas como atividades mecânicas.
Dentro desse processo de construção da leitura autônoma e crítica, por parte dos estudantes, o(a) professor(a) dev estar atento a algo que muitas vezes é ignorado no processo de ensino/aprendizagem da leitura e escrita: o envolvimento do(a) estudante com o texto escrito: oralizado e trabalhdo em sala de aula. Ao ignorarmos a relação de envolvimento desses estudantes com o texto lido o(a) professor(a) perde a oportunidade de investigar e compreender as relações de sentido atribuídas por esses estudantes ao texto (Teixeira, 2004), além de ignorar a leitura como um processo que depende muito dessas relações estabelecidas pelo(a) leitor(a), inclusive as relações de conhecimentos prévios estabelecidos com o texto (Cafieiro, 2005).
A leitura literária como formadora de leitores na EJA
A partir da leitura de Jane Paiva (2005) foi possível constatar que em geral, no Brasil, há uma crise da leitura em todos os níveis de ensino, mas pouco se tem falado sobre a gravidade dessa crise na educação de jovens e adultos. Paiva (2005) destaca este fator devido à associação que se tem feito entre alfabetização de jovens e adultos e sua relação com a leitura de vários gêneros textuais em diferentes suportes.
A leitura desse público, com maior ou menor experiência, deve se constituir, segundo a autora, em um processo crítico de formação de novos leitores capazes de atribuir novos sentidos e construir senso crítico inerente ao processo de alfabetização que possui formas próprias de compreender e ler. Entretanto o processo de leitura e escrita tem se restringido a utilização de materiais didáticos que ensinam a ler e não promovem a leitura, pois reduzem os textos ao ensino da língua, da gramática e ortografia desconsiderando a qualidade textual. Com os textos literários o problema tem sido maior, pois além de serem reduzidos a trabalhos de aprendizagem da língua eles são descontextualizados e esvaziados de sentido, impedindo a aproximação efetiva dos leitores com essa modalidade de leitura.
A esses estudantes não se deve oferecer apenas a alfabetização ou a continuidade de estudos como cumprimento de etapas; torna-se necessário desperta-lhes para "as possibilidades que a leitura polissêmica dos textos de literatura" proporcionam desenvolvendo neles novos sentidos, novas maneiras de estar no mundo e produzir cultura (Paiva, 2005).
Apesar da leitura literária possuir basicamente o livro como suporte, devemos proporcionar aos leitores jovens e adultos uma leitura literária transgressora de sentidos, de significados e da realidade como o fazem os novos suportes de textos, pois o texto literário proporciona: a criatividade, a ousadia, a inventividade. Ele dá espaço à cultura da história e da memória resgatadas por estudantes jovens e adultos ao proporcionar: lembraças de histórias ouvidas; resgate das histórias de leituras de cada um; a identificação com a própria história. Quando a cultura da história e memória desses estudantes são valorizadas, a cultura do silêncio à que os mesmos foram submentidos por não saberem ler e escrever é anulada podendo construírem novos sentidos à vida e ao que sabem (Paiva, 2005).
Considerações Finais
A educação de jovens e adultos é um direito e como direito devemos proporcionar-lhes a vivência de se construírem como sujeitos e cidadãos capazes de compreenderem a sociedade em que vivem e compreenderem a si mesmos e as relações que estabelecem. Para isso faz-se necessário construir com eles a autonomia nos processos de leitura que vivenciam em seu cotidiano ou em quaisquer situações em que precisarem se envolver com a leitura.
Como em nossa sociedade letrada há contextos, suportes, gêneros textuais, objetos textuais que promovem leituras diversificadas e com especificidades próprias, cabe aos formadores destes leitores proporcionar-lhes não somente o aprendizado da leitura, mas o envolvimento com as mesmas..O envolvimento com o texto só se torna possível quando não se estigmatiza leituras, nem se estabelece hierarquias do que é mais importante ou valoroso entre os vários gêneros textuais circulantes em nossa sociedade; quando os(as) estudantes estabelecem relações de sentido e construções de significados com o texto.
A leitura literária passa a ser de suma importância no envolvimento dos(as) estudnates jovens e adultos com o texto ao promover o resgate de memória e possibilitar a (re)criação de histórias, inclusive a história dos(as) próprios(as) estudantes desde que seja estabelecida uma relação integral com o texto e não o uso do texto como pretexto para o estudo da língua, da gramática, do falar bem e da ortografia.
Referência Bibliográficas:
BATISTA, Antônio Augusto Gomes et al. Capacidades da alfabetização: Leitura. Belo Horizonte: Autêntica/Ceale/FaE/UFMG, 2005, pág. 61-72. Coleção: Instrumentos da Alfabetização, caderno 2.
CAFIEIRO, Delaine. Leitura como processo: caderno do formador. Belo Horizonte: Ceale/FaE/UFMG, 2005.
PAIVA, Jane. Literatura e neoleitores jovens e adultos - encontros possíveis no currículo? In: PAIVA, Aparecida; MARTINS, Aracy, PAULINO, Graça; VERSIANI, Zélia (orgs.). Leituras literárias: discursos transitivos. Belo Horizonte: Autêntica/Ceale/FaE/UFMG, livro 6, 2005, pág. 55-68.
TEIXEIRA, Vânia Laneuville. Leituras e leituras na educação de jovens e adultos. In: PAIVA, Aparecida; MARTINS, Aracy, PAULINO, Graça, VERSIANI, Zélia (orgs.). Democratizando a leitura: pesquisas e práticas. Belo Horizonte: Autêntica/Ceale/FaE/UFMG, livro 5, 2004, pág. 177-186.
Publicado por: Simone Maria Bandeira Moutinho. Pedagoga formada pela UFMG.